Beto também lá esteve, sim senhor. Fixem aqueles headphones. |
A vida acabou. Em termos de Europeu 2012 e para a Selecção
Portuguesa, bem entendido. O corolário: uma copiosa vitória moral, uma goleada
da ilusão, um tiki-taka de azar.
No que concerne aos resultados, este Europeu não ficou aquém
do Euro-84, com o senão que os bigodes farfalhudos eram superiores em
quantidade e qualidade nesse certame que já festejou as bodas de prata. Mas
ficou acima do Euro-96, pese embora esse tenha contado com Porfírio, pelo menos
na foto de grupo, e tenha sido aqui que se introduziu a bandeirinha portuguesa
(não confundir com o Bandeirinha, já sobejamente impregnado na cultura
bolística à época), então ainda muito timidamente a espreitar fora dos bolsos
de António “O Bigode Fica-me Mesmo Bem” Oliveira para Sá Pinto beijar. Sim, era
uma altura em que Sá
Pinto ainda demonstrava gestos de carinho junto de
seleccionadores e onde cabelos à tigela eram toleráveis. E este Euro-12 foi
mais agradável que o cinzento Euro-08. Pecou, porém, por não ter um bode
expiatório ao nível de um árbitro, como no Euro-2000, ou ao nível de um
Ricardo, como no Euro-04. Resta-nos saborear esta derrota da melhor e mais
inventiva forma possível, porque é com derrotas honradas que se constroem
palmarés capazes de orgulhar toda esta nação.
Façamos uma análise individual a alguns nomes deste Europeu:
Hugo Almeida – deu água pela barba. Evidentemente, não das
defesas adversárias; a expressão deve ser lida literalmente: a sua barba
parecia molhada. Suor, água ou cuspo do adversário, não sabemos.
João Pereira – ficou a dever a si mesmo mais um ou outro
cartão amarelo. Poderia ter-se envolvido em mais picardias fúteis. Não foi o
rufia do costume e até aceitou repreensões do árbitro sem referir com veemência
a profissão da sua mãe. Uma desilusão.
Rúben Micael – uma postura impecável em todos os bancos por
onde passou. Fossem eles no campo, no autocarro ou no avião. Testou com grande
eficácia a ergonomia dos assentos. A rever.
Miguel Lopes – fez um tackle a destempo sobre o Quaresma.
Tem um braço muito graffitado e outro por graffitar, o que lhe confere um
aspecto de Igreja de Sta. Engrácia, ou seja, parece inacabado.
Quaresma – sofreu falta do Miguel Lopes e reagiu com um
pontapé. Mas não um pontapé qualquer; foi um pontapé de trivela com uma
ressonância acústica maravilhosa na caneleira de Miguel Lopes. Digamos que foi
um pontapé digno da mítica camisola 10.
Hugo Viana – um trabalho de sapa a fornecer Powerade aos
colegas, visão de jogo para saber onde colocar o colete e classe na forma como
ajudou a carregar as balizas nos treinos. Foi injustamente menosprezado.
Custódio – o “wonder sub”. Quando foi preciso resolver nos
minutos finais, Custódio disse “presente”, foi lá para dentro estancar
hemorragias tácticas e, com sorte, provocar hemorragias nasais nos adversários.
O estilo rendilhado do seu futebol construído de passes para o lado e para trás
cativou as bancadas nos breves minutos em que pôde demonstrar o seu valor.
Provavelmente, o jogador com o maior rácio faltas cometidas/minutos em jogo.
Eduardo – fantástico. De longe, o melhor cantor de hino da
Selecção. Todo ele alma, todo ele sentimento; Eduardo é o Alfredo Marceneiro
que andávamos há bastante tempo à procura. Agora já só falta encontrar um
ponta-de-lança. Uma lagrimazinha também não lhe teria ficado mal, ele que já
provou ser um bom choramingas, mas pronto, não exijamos demais ao 3º
guarda-redes. Curiosamente, também ficou em 3º nesta votação particular. Está
claramente de parabéns.
Nélson Oliveira – ganhou a convocatória por ter um penteado
mais parvo que o do Ronaldo e por ostentar umas orelhas maiores que dois Joões
Moutinhos inteiros ou meio-rabo do Miguel (que é como o Miguel Veloso gosta de
ser tratado). É uma estrela meticulosamente preparada pelos marketeers, sendo
neste aspecto como a pescada: antes de o ser, já o era. Marcou menos golos que
o Postiga e rematou menos que o Hugo Almeida, o que por si só pode destruir um
currículo, mas toda a sua equipa de promoção irá ignorar este facto.
Rolando – Rolando? Ah, nós queríamos era falar do Ronaldo…
Sobre gente estranha à Selecção não nos pronunciamos.
Ronaldo – não, afinal não queremos falar do Ronaldo, seria
demasiado “trendy”. O Messi que fale dele, se quiser.
Bruno Alves – o eterno fascínio pelo contacto físico à laia
de uma locomotiva descontrolada, pelo salto com apoio ilícito, pela bofetada
extemporânea na tromba do oponente, pela pisadela
involuntária-mas-que-podia-ter-sido-evitada-com-mais-cuidadinho nas virilhas do
tipo que está no chão e pela proliferação do palavrão. Como o mais velho dos
jogadores, deu o exemplo.
Raul Meireles – a grande figura da Selecção. Em termos
de profusão estilística, claro: ele é óculos escuros vistosos, enorme densidade de
tatuagens, barba por fazer, capuz na cabeça à saída do autocarro mesmo à xunga
e, como cereja no topo no bolo, a maior demonstração de vedetismo
contemporânea: os headphones vermelhos gigantes pendurados no pescoço. Este
tema merece um subcapítulo à parte.
OS HEADPHONES VERMELHOS
O adereço em causa - os chamados "Monster Beats". Aproveite já você também! |
Nas oportunas e sempre pertinentes reportagens do Nuno Luz,
foi possível vislumbrar um denominador comum: elevados índices de vacuidade.
Pronto, dois denominadores comuns: a vacuidade e os headphones vermelhos gigantes
portados pelos jogadores. Rivais dos headphones utilizados por profissionais de
estúdio, estes headphones tornaram-se extremamente populares entre as vedetas
de bola, destronando os outrora “must bes” da moda das estrelas que foram, por
exemplo, as pochetes e as madeixas. Um jogador consagrado da Selecção ir a
algum lado sem estes headphones, em geral colocados em descanso no pescoço,
parece hoje quase tão irreal como o Ronaldo jogar sem o cabelo completamente
grudado. Os headphones vermelhos estão para a vedeta como a tatuagem de “Amor
de Mãe” está para um ex-combatente no Ultramar.
Porque são tão grandes? Não sabemos. Talvez possuam
uma potência assombrosa e proporcionem uma sensação de conforto muito agradável nas orelhas. Mas deve ser para replicar o fenómeno estético dos
grandes tijolos que fizeram furor na comunidade hip-hop. Porque são todos
vermelhos? Ignoramos. Pode ser uma questão de marca ou pode ser para combater a
escassez de benfiquismo na Selecção. Se funcionam efectivamente enquanto ponto
de escuta? Não conseguimos afirmar. Mas também não interessa; o que importa é
que funcionam como adereço e o facto de possuir uns headphones vermelhos
gigantes pendurados no pescoço é um genuíno grito de vedetismo. São um
“statement” de afirmação em si mesmos. E depois, para bem da saúde dos próprios
headphones, sempre é melhor aconchegar-se num pescoço qualquer, mesmo o imbuído
de pura ruindade como o do Pepe, do que aturar a pimbalhada musical que tanto
agrada ao jogador de futebol debitada a decibéis impróprios. E depois, dói só
de imaginar a quantidade de cera acumulada nas cavidades auriculares e a
extracção da mesma por intermédio duma unha dum, sei lá, Ricardo Costa
qualquer.
Quem não se adapta a estas novas realidades sofre as
consequências. Por exemplo, vimos numa dessas reportagens o Rui Patrício sentado
ao lado do João Pereira no autocarro, utilizando uns headphones finíssimos de
iPod, desgarrados de todo o ambiente, minimalistas, brancos, quase
imperceptíveis. Patrício, bronco como sempre, não suspeitou de nada, sorriu
para a câmara e carregou no “play”. Ao seu lado, João Pereira gozava com o caricato da situação, quase rebolando no banco ao aperceber-se do óbvio.
Virou-se para Patrício e, com a eloquência que o caracteriza, deve ter-lhe dito
qualquer coisa como, “ó meu ******,
****-** que essa ***** desses phones já não se usam, ********! ****-**, que
estou ****** com este ************, ó ********!.... Se queres ouvir som, vai
mas é lá para trás, ó ********* que te ****, **********! ********, **** de
******, *********!”, que obviamente não foi reproduzido. Mas Patrício não
percebeu o alerta, empenhado que estava em ouvir o seu Jay-Z, Jessie J ou Zé
Cabra e ficou a dar mau-aspecto o resto da viagem.
Patrício tem potencial, de facto. Mas só se tornará numa
estrela internacional e concretizará uma transferência digna de Roberto se
começar a usar uns headphones vermelhos publicamente. Porque doutra forma nunca
será visto como um grande jogador e será apenas um pacóvio que gosta de ouvir
som. E para ouvir música estão os gajos na bancada com os seus headphones
corriqueiros. É verdade, o hábito faz o monge e os headphones vermelhos fazem
um jogador.
O efeito dos headphones vermelhos. |
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